Crise Habitacional — Porque é que cada vez é mais difícil encontrar casa?

Encontrar uma habitação em Portugal tornou-se um desafio que se estende a toda a Europa.
O custo da habitação absorve hoje uma parte substancial do rendimento das famílias. Nos últimos dez anos, o fosso entre o aumento dos rendimentos e o aumento dos preços das casas acentuou-se drasticamente: o preço da habitação cresceu cerca de 10% acima da evolução dos salários.
O resultado é preocupante, uma pressão constante sobre o orçamento das famílias e uma dificuldade crescente no acesso à casa própria.

 Um mercado em desequilíbrio
O mercado imobiliário está numa fase de um forte desequilíbrio entre a oferta e a procura.
Do lado da procura, são vários os fatores que atuaram em simultâneo e colocaram o setor numa situação extremamente delicada:
•    O acesso facilitado ao crédito permitiu que mais famílias comprassem casa, mas também inflacionou os preços.
•    O alojamento local e o arrendamento temporário retiraram milhares de casas do mercado de arrendamento de longa duração, agravando a pressão nos centros urbanos.
•    As políticas de atração de investimento estrangeiro contribuíram para a reabilitação urbana e para o aumento do turismo — tornando as cidades mais bonitas, mas também mais caras e menos acessíveis para os residentes locais.
•    As alterações demográficas e sociais, com o aumento da migração e das famílias monoparentais, elevaram ainda mais a procura.
•    A pandemia mudou os hábitos de vida. O teletrabalho veio contribuir para o aumento  da procura por casas maiores e fora dos centros urbanos, fazendo disparar os preços das periferias.

Do lado da oferta, o problema é estrutural
A construção de novas habitações não acompanham o ritmo das necessidades. Quase não existe construção para o segmento médio e segmento baixo e faltam casas a preços acessiveis.
A escassez de terrenos a preços acessíveis, a lentidão dos processos burocráticos, a falta de mão de obra qualificada e a preferência fiscal pela reabilitação urbana limitam a oferta.
Além disso, Portugal tem uma das taxas de habitação social mais baixas da Europa, reflexo de décadas de desinvestimento público neste setor essencial.

 Medidas que funcionam tipo bem-u-ron, aliviam, mas não resolvem
As medidas governamentais têm tido um efeito limitado e não são faceis de serem implatadas porque envolvem vários sectores económicos directamente dependentes do mercado habitacional-
Os incentivos fiscais e subsídios ajudam a curto prazo, mas não resolvem a causa primordial do problema: a falta de habitação disponível.
A solução sustentável passa por aumentar a oferta e criar um planeamento estratégico que envolva:
•    Políticas de uso do solo ajustadas à realidade de cada região;
•    Dinamização dos transportes públicos e descentralização dos serviços;
•    Atração de empresas e indústrias para fora dos centros urbanos;
•    Coordenação entre políticas locais, nacionais e europeias.
Só um plano integrado pode aliviar a pressão habitacional e promover o equilíbrio entre as necessidades das famílias e o dinamismo económico das cidades.

Habitação: bem essencial ou ativo financeiro?

No fundo, a dificuldade em encontrar soluções eficazes nasce de uma questão de base: para uns, a habitação é um bem essencial; para outros, é um ativo financeiro.

Enquanto esta dualidade não for clarificada nas políticas públicas, o problema persistirá.

Pensar e decidir que modelo de habitação e que tipo de cidades queremos é o primeiro passo para enfrentar de forma séria esta crise que afeta o presente e condiciona o futuro.

Andreia Nunes 
(Diretora Geral)